segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A pele da arte???

O maior órgão do ser humano é também aquele que traduz maior ambiguidade. A ligação da pele com a arte já dura há muito, com os desenhos das primeiras tatuagens e o uso de formas primitivas de maquilhagem. Não obstante, a arte do século XXI começa a deixar de lado os cânones artísticos associados ao uso da pele e avança para novas concepções. Perante a união da ciência com a criação artística, alguns das novas aplicações da pele criam espanto, mas também choque. Afinal, trata-se da última fronteira do ser humano com o mundo exterior.
Marta Lwin é um dos exemplos desta nova era de ligações entre arte e pele. A artista tem desenvolvido, nos últimos anos, um projecto de decoração corporal que assenta em material biológico. A ideia passa por criar uma espécie de tatuagem biológica, denominada oficialmente pela criadora como joalharia epiSkin, que pode ser usada e retirada. Todo o material tem por base células epiteliais, que se encontram nos tecidos que formam tanto a pele como o revestimento de órgãos e cavidades corporais internas.
Contudo, ao contrário do processo de criação das jóias tradicionais, a artista não desenvolve as peças epiSkin num ateliê, mas sim num laboratório. Em tubos de ensaio, as células são cultivadas de maneira a formar pele artificial, com contornos planeados previamente pela artista. O resultado é um híbrido entre tecnologia e biologia e, por outro lado, entre pele, tatuagem e jóia. Para realçar os cruzamentos entre biologia e técnica, as peças são usadas diretamente sobre a pele. Lwin acrescenta ainda um tingimento de tinta em cada peça, dando-lhes um apelo cromático.
As peças epiSkin são uns dos destaques da exposição temporária Skin, dedicada às sinergias entre a pele e a arte. Patente na Wellcome Collection, em Londres, a mostra reúne exemplos significativos da importância mutável da pele como conceito, desde a exploração anatómica do século XVI até aos usos artísticos. Na secção Skin Lab, onde está presente o trabalho de Lwin, o público pode tomar contato com explorações da arte às tecnologias relacionadas com a pele.
Também visível na exposição, o trabalho de Rhian Solomon assume uma vertente mais conceptual. A artista tem vindo a dedicar-se os seus projetos artísticos à pele, sob variadas perspectivas. Um dos projetos que ganhou maior notoriedade está relacionado com a cirurgia estética e os efeitos psicológicos após as operações. Solomon trabalhou com o vestuário usado no pós-operatório, que garante a correcta cicatrização da cirurgia, e com entrevistas realizadas a pessoas que se submeteram a operações plásticas. Algumas das citações obtidas foram então impressas, a laser, no vestuário.
O objetivo da artista passa por diluir as fronteiras entre pele e tecido, enquanto problematiza o impacto deste órgão superficial no estado psicológico humano. Afinal, é a pele um simples vestuário ou as suas marcas possuem correlação direta com as cicatrizes da alma?
Além desse projeto, Solomon tem continuado a brincar com diferentes materiais e tecidos, trabalhando-os de forma a acentuar as suas semelhanças com a pele humana, tendo em conta a elasticidade e a forma translúcida das matérias-primas.
De forma mais radical, o trabalho artístico de Heide Hatry tem tanto de sinistro como de espantoso. A alemã tem-se especializado em trabalhar com pele, de forma pouco convencional. A controvérsia atinge, desde já, a matéria-prima usada: pele de porco, o que pode causar um olhar mais crítico por parte de associações de defesa dos animais.

O seu mais recente projecto, Heads and Tales (que brinca com a expressão popular “caras e coroas”, acrescentando uma componente narrativa) utiliza carne, pele e olhos de porcos para tornar realidade um conjunto de cabeças femininas, que parecem existir entre os zombies das casas assombradas e uma realidade perturbadora. A semelhança imperfeita entre as criações a partir da pele de porco é intencional. A perturbação do espectador na problematização da mortalidade é a linha final do trabalho de Hatry. No entanto, outras questões afloram, como o uso da pele de animal para vestuário, a violência de género ou a natureza do material usado, tão semelhante à pele humana.
Heads and Tales reúne 27 bustos diferentes, com histórias de vida singulares. A artista convidou vários escritores a criarem universos imaginários para as “mulheres improváveis” que a artista esculpiu.
O talento para trabalhar com pele de suínos não se cinge a dar forma a cabeças femininas em quase-decomposição, já que Hatry tem apresentado variados projetos a partir deste material, incluindo a sua utilização em tecidos, problematizando as parecenças com a pele humana. A crítica ao uso de peles de animais torna-se por demais acutilante e a própria artista não se intimida perante a possibilidade de se vestir com as suas criações…

Fontes das imagens: Marta Lwin, Rhian Solomon, Heide Hatry.

Fonte: http://obviousmag.org/

Seja o primeiro a comentar!

Postar um comentário

Não serão aceitos comentários Anônimos (as)
Comentar somente sobre o assunto
Não faça publicidade (Spam)
Respeitar as opiniões
Palavras de baixo calão nem pense
Comentários sem Perfil não será publicado
Quer Parceria não será por aqui.(Contato no Blog)

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Software do Dia: Completo e Grátis

Giveaway of the Day
PageRank

  ©LAMBARITÁLIA - Todos os direitos reservados.

Template by Dicas Blogger | Topo