Lambari - MG - 1860 - Estado de decadência a que chegou a povoação.
Na sessão extraordinária de 28 de novembro de 1859, a Camara Municipal de Campanha tomou conhecimento dos dois seguintes fatos: o primeiro referente ao parecer do Dr. Joaquim Bueno Goulart Brun, concluindo que para impedir a invasão das enchentes nos poços da "agua gazosa de Lambari" não haveria necessidade de mudar-se o leito do rio, fazendo-o atravessar um morro, bastando unicamente retificá-lo e rebaixar o respectivo leito, obras essas cujo trabalho "não aquilatasse a 5.a parte do dispendio da pretendida mudança".
O segundo fato se reporta à comunicação feita pelo vereador Ferreira Lopes de que a "picada" que o engenheiro Henrique Dumont exigiu fazer-se nas Águas Virtuosas se achava pronta, picada que, juntamente com as obras a serem realizadas no rio, representava os planos de futuros melhoramentos, a serem feitos na povoação pelo Govêrno da Província.
Não se tendo, porém, iniciados os serviços dêsses planos e já do conhecimento da população, o periódico "Sul de Minas", em sua edição de 8 de julho de 1860, comentando o descaso do governo provincial pelo futuro das Águas Virtuosas, cujo povo reclamava, assim se expressou a respeito.: "apenas veio um engenheiro que depois de um 'ligeiro exame regressou, mandando abrir uma picada sem haver mais vestigio de sua passagem".
Enquanto o Distrito de Lambari (atual Jesuania) já possuía desde 1860, o seu, representante político. - o vereador Francisco Carneiro San Thiago Junior - a quem competia cuidar de todos os assuntos do distrito que representava,a administração do Distrito das Águas Virtuosas, continuou, em toda decada, a ser garantida por dois funcionários, representantes da camara municipal de Campanha: um fiscal aferidor de pesos e de medidas, e um fiscal agente. Ao primeiro estavam adstritas funções específicas de fiscalização das balanças e das medidas usadas nas vendas de víveres e de sal, cobrando dos fazendeiros dos tropeiros e dos negociantes de " molhados e secos " a quantia estipulada pelas leis em vigor; ao fiscal agente estavam adstritas funções de maior amplitude. A par de funções puramente informativas, cabiam-lhe, ainda, funções normativas fiscalizadoras, coercitivas, impondo multas e não raros executivas, submetendo, " a posteriori ", à apreciação da Camara Municipal de Campanha as medidas tomadas.
Justamente por isso e para que não houvesse hiato na administração, o cargo de fiscal agente deveria ser exercido por pessoa de bastante espírito público e não estar sujeito a constantes substituições consoante o verificado no transcurso da década em que o cargo de fiscal agente foi exercido pelas sete seguintes pessoas:
1.a: Candido José Marianno, que já vinha exercendo desde 1859 e que em 1.0 de abril de 1861 se exonerou a pedido, por se transferir para outro Distrito.
2.a: Antonio Pereira de Gouveia, fiscal suplente, que entrou logo em exercício, substituindo a Candido José Marianno, exercendo o cargo até 8 de abril de 1862, quando solicitou a exoneração por se achar "bastante incomodado em sua saúde e alcançado em idade, tendo, também, pouca vista".
3.a: Felício Avelino Corrêa, que exerceu o cargo de 15 de maio de 1862 até 6 de janeiro de 1864, quando se demitiu.
4.a: Manoel lzidoro de Carvalho, que exerceu o cargo de 12 de junho de 1864 até março de 1865.
5.a: Olímpio Pereira Pinto, que exerceu o cargo de abril de 1865 até agosto de 1866.
6.a: Pedro Francisco Freimont, que exerceu o cargo de setembro de 1866 até fins de 1868, quando faleceu.
7.a: Antonio Joaquim do Nascimento, nomeado diretamente pelo Presidente da Província, por portaria de 15 de fevereiro de 1869, contrariando frontalmente os desejos da Camara Municipal de Campanha, que se opusera a dar-lhe posse.
Estas freqüentes mudanças de funcionários, com aproveitamento de pessoas que, não raro, demonstraram desinterêsse no cumprimento dos deveres funcionais, e mais o período de vacância entre uma nomeação e outra, às vêzes longo, e dentro do qual tudo corria sem fiscalização, todos êstes fatores criaram situações e problemas que deram à povoação o aspecto
de um lugar abandonado. Em II de abril de 1862, Francisco Carneiro San Thiago Junior, vereador do Distrito de Lambari, faz a seguinte comunicação à Câmara Municipal de Campanha:
"Como tistimunha ocular do estado de ruinas em que se achão diversas pontes no centro da Povoação das Aguas Virtuosas e suas passagens que com o risco de vida atravessa-se, devido a negligencia do Fiscal e dos habitantes que tem deixado de conservarem suas testadas, e como se aproxima a epoca da afluencia de grande numero de pessoas de diversas Posiçoens e como existe tambem um grande pantano, necessariamente convem aterralo".
Em 22 de agôsto de 1862, em carta de Luiz de Souza Lima dirigida aos vereadores de Campanha.propondo melhoramentos para a povoação, encontram-se as seguintes expressões: "As aguas virtuosas vão detriorando. Consta que há dinheiro para beneficio das aguas Virtuosas e com elle se poderá arranjar bem o lugar".
Em carta de 4. de julho de 1863, enviada à Câmara Municipal de Campanha, o fiscal Felício Avelino Corrêa relata o seguinte:
"O abaixo assignado Fiscal deste Distrito cumprindo com huma de suas atribuições participa por esta a V. S.as que as pontes das principaes ruas desta Povoação estão em estado de cauzar algum desastre por estarem podres e em parte desmanchadas. Segue daqui um caminho para o ponto mais importante deste Distrito que passa na fazenda dos Gonçalves por cujo caminho estes Srs. nos fornecem aqui viveres em abundancia, e este anno pelo mao estado do caminho talvez aja aqui falta. Alguns fazendeiros reuniramse aqui de fazer um caminho em que os carros poderem transitar, porem está acima das suas forças, eu como fiscal tomo a liberdade de lembrar a V.a S.as pelo bem publico que esse caminho é de summa utilidade para os povos deste lugar e posso afiançar que se essa Ill. ma Camara concorrer com seu contigente o caminho se fará".
Em 1864, a povoação que não assistia à construção de uma "moradia de casa" desde 1862 e que continuava a manter suas ruas em meio de pântanos ,e com suas pontes em ruínas, viu agravar-se a situação, a que os podêres públicos da Campanha não queriam ou não podiam corrigir. A velha estrada que ligava a povoação à Campanha e ao Distrito de Lambari (atual Jesuânia), as estradas que se dirigiam para a freguesia de São Gonçalo, para a povoação de Conceição do Rio Verde e os caminhos que levavam às fazendas do Distrito exigiam consertos urgentes. O fiscal Manoel Izidoro de Carvalho retrata fielmente todo estado de decadência existente, na seguinte carta enviada à Câmara Municipal de Campanha, em 18 de julho de 1864:
"Remeto a essa Camara a relação conforme me foi exigida:
1.0 que he precizo concertar-se a estrada da serra que segue desta povoação para a cidade;
2.0 que he precizo os mesmos concertos que segue desta Povoação para a Freguezia de São Gonçalo;
3.° que tambem é preciso concertar-se a estrada que segue desta Povoação para a Freguezia do Lambary, onde passa o rego da agua que Francisco Moreira de Oliveira fez e como seja prejudicial ao tranzito publico por passar o rego muito perto do caminho;
4.° que he precizo cobrir-se o mesmo rego no lugar onde atravessa a estrada perto da Caza de Antonio Pereira de Gouveia por ser o rego bastante fundo e em lugar publico, o que pode resultar algum perigo;
5.° que he precizo fazer-se duas pontes, uma no leito velho e outra na nova dentro desta povoação na estrada que segue daqui para Conceição do Rio Verde;
6.° he tambem precizo um aterro na Estrada que vem dessa Cidade em um corgo perto do Rancho de D.a Anna Esmeria Ribeiro, que em todo tempo das Aguas, torna-se intransitavel;
7.° he precizo um aterro na sahida da ponte perto do mesmo Rancho, ao lado da Povoação e é precizo um esgoto no largo do poço que começa para cima da caza de Daniel Paes Pinheiro e passa perto do poço das aguas virtuosas até o Rio. E uma ponte na rua onde passa o esgoto e um aterro em cada lado da mesma ponte por ser lugar bastante baixo e as aguas dos Montes entrão no poço das Aguas Virtuozas e formão na rua um pantano intransitavel;
8.° Levo ao conhecimento de V.a S.as que existe nesta povoação tres cazas de jogos que continuam sem appresentarem-me a licença, sendo estas de José dos Santos Andrade, Bernardo Ferreira da Silva e Jacob Klues;
9.0 Que José dos Santôs'Andrade tem vendido Agoardente sem pagar os direitos pertencentes a essa 'Camara;
10. o sobre os jogos já fiz: um officio ao Procurador da Camara porem não deu providencia ao dito fim;
11.0 No dia 20 de setembro de 1863' vindo os musicos do Lambary ao fim de divertir-se e tocarem nesta povoação segundo o Costume, nesta.occazião foram espancados dentro da Povoação do que fizerão Auto e não inquirirão testemunhas porque dizem que inda que reprove e se crimine os Autores das pancadas, estes serão-despronunciados pelo Juiz de Direito. E deste modo está parada a acção tendo-se testemunhas para o dito fim.;
12.0 Que Felicio Avelino Corrêa maltrata seus escravos e escravas com pancadas que não é permitido aos Christãos como é publico neste lugar, segundo se vê as cicatrizes nas mesmas escravas o que é admirado pelo publico;
13.0 Não posso ser mais recto em minha relação em razão de não ter regulamento por onde me hei de guiar apezar de o ter por muitas vezes ao Escrivão da Camara desta Cidade e não tenho obtido"
(OBS) Escrito na linguagem da época
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