Um Brasil europeu
Colégio Brasileiro de Genealogia
Fundado em 1950
UM BRASIL EUROPEU
Genética revela que ancestralidade europeia é maior que africana e preponderante
O GLOBO, 18/02/2011 p.36
Os brasileiros são bem mais europeus do que africanos. Esqueça todas as análises já feitas com base em conceitos como raça e cor da pele. O primeiro grande estudo a medir a ancestralidade da população do país a partir de sua genética revela uma participação europeia muito maior do que se imaginava, preponderante em todo o território; inclusive nas regiões Norte e Nordeste. As conclusões estão na pesquisa coordenada pelo geneticista Sérgio Danilo Pena, da Universidade Federal de Minas Gerais, e publicada na revista científica .
O trabalho revelou que, em todas as regiões, a ancestralidade europeia é dominante, com percentuais que variam de 60,6% no Nordeste a 77,7% no Sul. Mesmo as pessoas que se denominam negras pelos critérios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentam, na verdade, uma alta ancestralidade branca. Para se ter uma ideia, na Bahia, os negros tem 53,9% de raízes europeias. Na análise dos especialistas envolvidos no trabalho, a "europeização" do Brasil se deu a partir do fim do século XIX, com o fim do tráfico negreiro e da escravidão e o início do fluxo migratório de aproximadamente 6 milhões de trabalhadores europeus.
Para além do impacto histórico e antropológico que os resultados do novo estudo podem ter, Sérgio Pena ressalta ainda a sua importância do ponto de vista médico: os tratamentos podem ser mais homogêneos do que se imaginava.
As três raízes ancestrais do país
Formada por três diferentes raízes ancestrais, indígena, europeia e africana, a população brasileira sempre se acreditou muito heterogênea. Estudos da era pré-DNA, baseados na cor da pele ou no polêmico conceito de raça, tradicionalmente indicaram fortes diferenças regionais, com grande presença indígena no Norte, africana no Nordeste e europeia no Sul. A partir da análise do DNA de 934 brasileiros, o grupo de Sérgio Pena conseguiu rastrear os reais componentes de ancestralidade europeia, africana e ameríndia de cada um deles.
– De certa maneira foi uma surpresa afirmou. Esperava encontrar níveis elevados de ancestralidade europeia no Sudeste e no Sul, mas não no Norte e no Nordeste.
A mistura das três raízes ancestrais, argumenta Pena, resultou numa paleta vasta de cores de pele para o povo brasileiro; na verdade, bem mais ampla do que o branco, preto, pardo e amarelo usados pelo IBGE. Ainda assim, um dos aspectos mais curiosos do estudo é revelar que a cor da pele do indivíduo (como é percebida por ele ou por outros, não importa) nem sempre está diretamente relacionada à sua ancestralidade. Ou seja, um sujeito pode ser branco e ter um maior percentual de ancestralidade africana e vice-versa.
Acho que o estudo tem muitos dados novos, que as pessoas nem suspeitavam sobre o povo brasileiro – afirmou Pena. – Os dados genômicos enriqueceram muito o conhecimento que temos da população. Sobretudo, mostramos que a ancestralidade não está necessariamente ligada à cor da pele.
Na verdade, o estudo conclui que, independentemente de eventuais classificações baseadas na cor da pele, os brasileiros são muito homogêneos do ponto de vista de sua ancestralidade.
– Existe muito menos diferença do que era esperado, a homogeneidade é muito maior do que se imaginava e nós conseguimos identificar o grande fator homogeneizante: o influxo de 6 milhões de europeus
Tentativa de 'embranquecimento'
O estudo mostra que, num primeiro momento, o Brasil contava com uma população de cerca de 2 milhões de indígenas e, logo após o descobrimento, começou a receber portugueses, em grande maioria homens. Entre 1500 e 1808 (data da vinda da corte), foram cerca de 500 mil. O tráfico de escravos, que começou em meados do século XVI e se estendeu até 1850, teria trazido ao Brasil 4 milhões de africanos. Em todo o período houve uma significativa mistura de homens europeus com mulheres índias ou negras, formando as primeiras gerações de brasileiros.
Com o fim da escravidão e a crescente necessidade de mão de obra, houve uma opção pelo trabalhador europeu, no que.teria sido uma tentativa deliberada de "embranquecimento" do país.
– O processo que começou com D. Pedro II e continuou depois da Proclamação da República, tinha um ohjetivo bastante claro – disse Pena. Ele foi muito influenciado pelo conde Gobineau (Arthur de Gobineau, adido francês no Brasil), um dos maiores racistas do mundo e amigo pessoal de D. Pedro II. A ideia era de purificação da raça pela europeização.
O estudo comprova que o Brasil é, antes de mais nada, um país de mestiços. Quanto mais misturada for uma população, menos a ancestralidade coincide com cor da pele. Portanto, só dá pra dizer que somos todos brasileiros.
À FLOR DA PELE: REFLEXOES DE UM GENETICISTA, Sérgio Danilo Pena, Ed. Vieiralent: 2007
HOMO BRASILIS: ASPECTOS GENÉTICOS, LINGÜÍSTICOS, HISTÓRICOS E SOCIOANTROPOLÓGICOS DA FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO, Sérgio J. Pena (org.), Ribeirão Preto, FUNPEC-RP, 2002.
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