terça-feira, 8 de abril de 2008

Lambari - MG - As terras campanhenses.Descoberta da água mineral de Lambari.

No transcurso do século XVIII dois grandes acontecimentos surgiram na região situada ao sul do território mineiro, na zona compreendida entre a margem esquerda do Rio Verde e a margem direita do Rio Sapucai. O primeiro acontecimento se refere à fundação de Campanha, em 2 de outubro de 1737, e o segundo, à descoberta das nascentes da água mineral de Lambari, no transcurso da década de 1780.

Desde quando, nos fins do século XVII, o Padre João de Faria, de Taubaté, se referira às pedras coloridas e ao ouro das minas do Rio Verde, na região de São Gonçalo e Campanha banhada pelos rios citados, elementos desgarrados das bandeiras paulistas nela se fixaram e exploraram clandestinamente o pouco ouro existente. O governador da Capitania de Minas Gerais, Martinho de Mendonça de Pina e Proença, tão logo assumiu o govêrno, com o fim de coibir o abuso existente, houve por bem instituir o aparelho arrecadador em tôda zona, enviando para essa missão o Ouvidor da Comarca do Rio das Mortes. Partindo de São João D'EI Rei a 23 de setembro de 1737, a 2 de outubro o ouvidor da Comarca, Cipriano José da Rocha, fundou "um arraial em forma de villa", que recebeu o nome de São Cipriano, onde mandou fazer um rancho para si, ordenando, ainda, que todos fizessem o mesmo "em boa ordem, com ruas, praças e igrejas".

O arraial de São Cipriano, posteriormente Campanha do Rio Verde, Campanha da Princesa ou simplesmente a Campanha de hoje, ao mesmo tempo em que firmou a presença da Comarca do Rio das Mortes em extensa área do território das Minas Gerais, somente pisada, até então, pelo bandeirante que se dirigia para as serras coloridas da lagoa Vupabussu, se constituiu, por outro lado, como autêntico pioneiro no desenvolvimento de quase todo Sul de Minas, como centro de toda civilização sul mineira. Antes dessa fundação, a Comarca do Rio das Mortes limitava sua zona de influência e de jurisdição até a margem direita do Rio Verde, em região onde já florescia a Vila de Baependi e onde já despontava a povoação de Pouso Alto. Pelo aparecimento do arraial de São Cipriano, os limites da Comarca do Rio das Mortes foram levados, pelas terras campanhenses, da margem esquerda do Rio Verde para além do vale do Rio Sapucaí, atingindo o alto da Serra da Mantiqueira pelo lado meridional e as cabeceiras dos Rios Pardo e Jaguari, na Capitania de São Paulo, pelo lado ocidental.

Paralelamente ao surto de desenvolvimento do· arraial, já tornado freguesia da Campanha do Rio Verde em 1752 - 15 anos depois de fundada - dentro das terras campanhenses começaram a surgir arraiais e povoações que constituem hoje importantes municípios do Estado de Minas Gerais. Os municípios de Lambari, Jesuânia, São Gonçalo do Sapucaí, Cambuquira, Conceição do Rio Verde, Três Corações, Jacuí, Pouso Alegre, Silvianópolis, Itajubá, Santa Rita do Sapucaí e Ouro Fino nasceram e se desenvolveram dentro das terras da Campanha, cuja vila, criada em outubro de 1798, influiu de maneira decisiva na vida religiosa, social, política e cultural dos povoados que surgiam.

De particular com Lambari, a região do Lambari, então existente, se incluía nas terras campanhenses formando grande área territorial por onde passa o rio Lambari. Descendo da serra do Pouso Frio pelos lados do Município de Cristina, o rio Lambari serpenteia por entre as serras do Bom Jardim e da Bocaiúva, sempre a leste dos municípios de Jesuânia e de Lambari e por entre as serras do Tapajós e do Cigano, ao sul do município de Cambuquira, para se lançar no Rio Verde no município de Três Corações.Seguindo sempre para o norte, ao sul do município de Cambuquira se desvia para o nordeste, desaparecendo nas águas do Rio Verde. Em todo seu trajeto recebe apenas dois afluentes, dois ribeirões que nascem e morrem no município de Lambari: o ribeirão Mumbuca, que se lança no rio Lambari a poucos quilômetros do matadouro municipal, e o ribeirão do Melo, que se perde no rio Lambari ao atingir a serra da Bocaina.
Em 4 de outubro de 1737, dois dias depois da fundação do arraial de São Cipriano, em carta dirigida ao governador da Capitania de Minas Gerais, Cipriano José da Rocha relatou as circunstâncias dessa fundação e informou, também, que as terras campanhenses já possuidoras de uma estrada aberta por êle em zona coberta de matos, alcançavam as margens do rio Lambari, rio com "copiosa abundância de peixe grosso e miúdo, de admirável sabor e gôsto por ser todo de pedra o rio". Esta característica assinalada com ênfase por Cipriano José da Rocha, não passou desapercebida ao silvícola que viveu na região, quando foi buscar nessa mesma característica o motivo para identificá-la, uma vez que o topônimo Lambari, corruptela de Arambari, por sua vez alteração de Araberi, tem o significado de sardinha, na língua tupi. Tôda área das terras campanhenses situada nas margens do rio Lambari era conhecida por Lambari e compreendia. tanto o território do atual município de Jesuânia. como o do atual município de Lambari. A expressão "neste Lambari me acho sem papel", contida na carta. de José Rodrigues da Fonseca, datada de 2de fevereiro de 1743, enviada a Francisco de Mendonça Essa, não indica apenas um lugar, como, principalmente, marca o início do povoamento da região, uma vez que José Rodrigues da Fonseca parece ser o seu mais antigo morador. A partir de 1743, começaram a aparecer as primeiras casas e o agrupamento dos primeiros moradores foi se formando ao longo das margens do rio Lambari,constituído pelas seguintes pessoas: José Rodrigues da Fonseca, natural de Baependi;Joãó Delgado, natural de Guaratinguetá; Amaro Alves da "Silva ; Simplício Lopes Maciel,natural de Jacareí ;Brás Nunes Gonçalves, natural de Guaratinguetá; Luiz Branco Sant' Ana; Ignácio Gomes de Abreu, natural de Candelária; Pascoal VieiraMonteiro, natural de Ilha Terceira; João Ferreira Ribeiro e Manuel Jacinto Tôrres.
Nos assentamentos do livro 1 de Óbitos da Catedral de Campanha ora. se assinala "moradores do Lambary". ora se assinala "moradores do Lambary de Sima", mostrando êsse fato que a região do Lambari, a partir de 1753, já estava dividida em duas outras sub-regiões, não se podendo, todavia, saber ao certo onde se situava, na região, o Lambari de cima. O conhecimento mais nítido da região de tôda zona do Lambari se processou após a descoberta das nascentes da água mineral na década de 1780 nas terras da fazenda de Antônio de Araújo Dantas, fazenda que se situava atrás da serra que separa os atuais municípios de Campanha e Lambari. Em plena mata, após uma queimada ou derrubada de grandes árvores, as nascentes foram descobertas por pessoas que caçavam nas terras da fazenda, não se tendo conhecimento do nome dos descobridores. A água aflorava à superfície fingindo "violenta fervura" e vertia das fendas de uma pedreira situada na margem de um ribeirão. Essa descoberta traçou os destinos do atual município de Lambari, que nasceu, cresceu e vive à sombra de sua água mineral, e, na época em que apareceu a água, o seu aparecimento deveria ter repercutido em tôda com arca do Rio das Mortes e em toda Capitania de Minas Gerais como um acontecimento de grande significação, já que até quando foi descoberta assinalavam-se em todo território nacional apenas duas fontes hidrominerais: a fonte do Cipó, na Bahia, descoberta em 1730, e a fonte de Caldas Novas, em Goiás, descoberta em 1737.

Tão auspicioso deveria ter sido o acontecimento que, pelas virtudes apregoadas por todos, a água começou a ser designada ora por água santa, ora por água virtuosa, nome que, fixado, designou também o local de uma região. A serra, até então conhecida apenas por serra, passou a ser denominada de serra da Água Virtuosa; a fazenda de Antônio de Araújo Dantas, até então conhecida por fazenda de "trás da serra", passou a ser chamada de fazenda da Água Virtuosa, e o local onde se localizavam as nascentes, na região do Lambari, passou a ser conhecido por Água Virtuosa. Êste nome, a partir de 1801, começou a ser usado quer em documentos oficiosos, quer em assentamentos religiosos, consoante se constata na carta de Antônio Borges da Costa, dirigida ao Governador Manoel Ferreira da Costa Neves, em que se lê: "ll de outubro de 1801, Distrito de Trás da Serra da Agoa Virtuosa", e no 5.° Livro de Óbitos da Matriz de Campanha, onde aparece o seguinte têrmo de óbito: "no primeiro de novembro de 1805, foi encomendado e sepultado no adro desta Matriz um innocente, filho de José Quaresma de Carvalho, morador de Trás da Serra da Agoa Virtuosa e falleceu elle de maligna, de que mandei fazer este assento que assinei. O vigario Francisco Moreira de Vasconcellos".A água virtuosa que vinha indicando o local das nascentes num ponto determinado da região de Lambari, se tornou, posteriormente, Águas Virtuosas, nome do município que figurou ao lado dos municípios do Estado de Minas Gerais até 27 de dezembro de 1930, quando, pelo decreto n.o 9.804, em decorrência de imperativos de ordem histórica e geográfica, se substituiu o nome de Águas Virtuosas pelo de Lambari.

NOTAS:

- O ribeirão Mumbuca é o mesmo ribeirão Lambari Pequeno assinalado com freqüência em documentos antigos e que atravessa a atual cidade de Lambari, do oeste para leste. Não se conhecem os motivos por que foi adotado o nome de Mumbuca, presumindo-se, todavia, que tenha sido dado pelos primeiros moradores da região da nascente do ribeirão (bairro de Santa Quitéria, bairro de São João e arredores) onde era freqüente a presença de marimbondos tidos também como mumbucas, nome popular de determinadas espécies de abelhas.

- O nome água virtuosa antecede ao de água santa. Enquanto aquêle se tornou usual a partir de 1801, este apareceu pela primeira vez em 1805, conforme o seguinte assentamento constante no 5.° Livro de Óbitos da Matriz de Campanha: "aos vinte e nove de novembro de mil oitocentos e cinco, foi encomendada e sepultada no adro desta Matriz, Jeronima, de idade de um ano, filha legitima de Joaquim Rodrigues de Oliveira, morador no alto da Serra de Agua Santa; falleceu de maligna, de que mandei fazer este assento que assinei. O Vigario Francisco Moreira de Vasconcellos".

(OBS) Escrita na linguagem da época

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