Segunda Guerra Mundial - Setembro a Dezembro de 1939 - Os beligerantes
Os beligerantes
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A invasão alemã da Polônia a 1o de setembro e a entrada da França e da Grã-Bretanha no conflito a 3 de setembro marcaram, não tanto o começo de uma nova guerra, como a abertura da fase mais intensa de uma guerra que já estava em desenvolvimento. Até onde já então tinha ido era uma questão de interpretação. Uma possível opinião era a de que ela, de qualquer modo, jamais tinha cessado, durante os anos que decorreram desde 1914. Um ponto de vista mais moderado, como o emitido pelo capitão Liddell Hart, poderia ser o de que o rebentar da rebelião espanhola, em julho de 1936, fôra o seu ponto de partida. Mas, para qualquer observador informado estava pelo menos claro que a luta, armadas por um período considerável antes de se recorrer às hostilidades, fôra conduzida de modo incruento, mas com crescente intensidade.
É que agora estava mundialmente reconhecido que a guerra moderna consistia em algo mais do que no choque de homens armados. Era uma luta de nações a utilizar todos os recursos à sua disposição para a derrota dos adversários e para proteger-se a si mesmas contra a destruição. Como Hobbes já escreveu, "a natureza da guerra consiste não na luta propriamente dita, mas na conhecida aptidão para isto". Exércitos, marinhas e forças aéreas eram as últimas reservas a serem colocadas na balança. Mas, embora estas pudessem garantir a decisão final, não a poderiam fazer quando não apoiadas. Elas não passam da ponta de lança que deve apoiar-se na haste representada pelo total esforço nacional. Da extensão dos recursos nacionais em capacidade industrial e permanente poder econômico, mesmo mais que o efetivo das forças armadas, depende a resistência daquela haste e o grau do poder ofensivo que a impulsiona. Um sumário do potencial de guerra dos beligerantes ao começar o conflito representa uma estimativa de seus recursos econômicos e a sua posição estratégica, não menos que a sua força em campo.
Para começar, os três beligerantes mais importantes eram, em grau variado, nações industriais. Numa guerra em que as forças em luta dependiam de armamento mecânico e da vasta quantidade de munições e suprimentos que essas armas exigiam, este era o requisito essencial. Entre esses beligerantes, a Alemanha indubitavelmente levava vantagem. Sua capacidade industrial, a segunda depois da dos Estados Unidos, era em bruto igual às da Grã-Bretanha e França combinadas. Além disto, enquanto os esforços das indústrias britânica e francesa eram dirigidos principalmente para a satisfação das necessidades comuns da coletividade em tempo de paz, a indústria alemã já estava organizada para finalidades de guerra. O Plano de Quatro Anos de 1936, que colocou o total da economia germânica sob a direção do general Goering, visava tornar a Alemanha imune da derrota fosse pelas armas ou pelo bloqueio. Canhões ao invés de manteiga, era o seu lema. "Vivemos numa fortaleza", disse Goering; e nessa fortaleza as energias dos oitenta milhões de habitantes eram concentradas antes de mais nada nos propósitos da defesa.
Os aliados ao contrário, tinham dado poucos passos a fim de controlar sua economia para finalidades de guerra. Os governos da França e Grã-Bretanha, é verdade, se tinham outorgado altos poderes de regulamentação da indústria, importação e câmbio estrangeiro. Mas, afora os passos em favor da nacionalização da indústria de armas que tinham sido dados pelo governo Blum, a França pouco fez para aplicar esses controles. Mesmo os planos das indústrias bélicas específicas que a Inglaterra tinha projetado em conexão com o rearmamento foram aplicados apenas moderadamente, e não foi senão em junho de 1939 que receberam coordenação central através do estabelecimento de um Ministério de Suprimentos. A economia desses dois países funcionava numa base essencialmente civil, quando a guerra rebentou.
Porém, apesar da Alemanha parecer possuir sob este aspecto uma vantagem inicial, esta devia ser considerada de várias maneiras. Em primeiro lugar, o próprio fato dos gêneros de consumo terem sido reduzidos de maneira tão drástica em benefício do rearmamento deixava pequena margem para maior intensificação dos esforços produtivos em favor das finalidades bélicas. Algo poderia ter sido feito, naturalmente, pelo racionamento, que reduziria ainda mais o consumo ordinário e deixaria disponíveis para as indústrias de guerra, tanto os trabalhadores como os materiais. O general von Fritsch tinha uma vez observado: "Embora se possa terminar uma guerra com cartões de racionamento, jamais se deve começá-la assim." Mas, o general von Fritsch tinha perdido o prestígio desde a sua demissão do posto de comandante-em-chefe em fevereiro de 1938, como resultado de sua oposição à invasão da Áustria. E não muito depois que a guerra começou foi revelado que ele encontrara a morte na Polônia durante a realização de uma perigosa operação de reconhecimento. Qual a natureza dessa operação, ou por que um general de tão alta projeção tinha sido encarregado de efetuá-la, eram perguntas em torno das quais o mundo especulava à vontade.
Assim, a guerra, no tocante à Alemanha, iniciou-se com cartões de racionamento. Uma série de decretos estabeleceu ferozes restrições em artigos como gêneros alimentícios, vestuário, sabão e automóveis. "Quanto à carne" - declara o rotundo Goering a uma assistência alemã no dia 9 de setembro - "pode-se dizer que nós a consumimos demais de qualquer maneira. Com menos carne ficaremos mais magros e necessitaremos de menos fazenda para o nosso vestuário." Mas com um standard de vida já próximo ao mínimo, e falta de trabalho mesmo antes da irrupção da guerra a Alemanha já parecia estar no cume dos seus esforços econômicos.
A França e a Grã-Bretanha, por outro lado, tinham ainda uma margem muito considerável e a qual ainda poderia ser incrementada por meio de cooperação eficiente. Já então elas tinham assentado coordenar seus esforços militares em caso de guerra. Quando esta rebentou, elas trataram de estender essa coordenação à esfera econômica. Um acordo comercial a 17 de novembro foi seguido de um tratado financeiro a 12 de dezembro. Juntos, constituíam eles um arranjo de um alcance sem precedentes. Significaram praticamente uma fusão de seus recursos em materiais bélicos, alimentos e tonelagem de navegação, bem como créditos no exterior. Uma política comum de compras no estrangeiro foi estabelecida não apenas para evitar competições na aquisição, mas também para regulamentar a importação de acordo com a produção e para elaborar um plano simples de distribuição, entre os dois países, das mercadorias necessárias a ambos. Os ativos no câmbio estrangeiro seriam utilizados em comum; o câmbio foi fixado em 176,5 francos para a libra; foram estabelecidas consultas e ações comuns sobre preços e créditos; a assistência financeira a outros países seria dividida numa base de 40 /o da parte da França e 60 da parte da Grã-Bretanha. "Por estes meios" - disse o comunicado aliado sobre o acordo de novembro - "arranjos foram feitos para a entrada em ação, dois meses depois do começo das hostilidades, da organização da comum atividade de ambos os países, a qual, no último conflito, só foi obtida no fim do terceiro ano." O acordo de dezembro realizou essa finalidade com muito maior perfeição que a existente durante a Grande Guerra.
Em segundo lugar, a indústria, seja na paz ou na guerra, depende das matérias-primas; e neste ponto a Alemanha estava em franca desvantagem. O seu próprio suprimento de gêneros alimentícios foi estimado como sendo apenas 83% adequado, com deficiências em frutas, legumes e especialmente em gordura. Em matérias-primas industriais, a Alemanha normalmente importava um terço de suas necessidades, a despeito de seus esforços para fomentar a produção interna e para obter sucedâneos. Em suprimentos especiais, ela tinha um superavit apenas em carvão, potássio e magnésio. Sofria de deficiências particularmente em matérias vitais como algodão, borracha, petróleo e ferro em bruto. Era verdade que os territórios propriamente ditos da Grã-Bretanha e França também careciam de muitos desses suprimentos. Mas, alguns podiam ser obtidos nos seus impérios, e os dois países tinham ainda acesso a outras fontes estrangeiras. Para a Alemanha tal acesso constituía um problema de solução muito mais difícil, já que seus inimigos retinham o domínio do mar.
Pelo lado militar, a Alemanha teve outra vantagem inicial que parecia, entretanto, de difícil extensão no futuro. Em relação ao exército, de fato, qualquer disparidade existente se mostrava favorável aos aliados. O exército efetivo de 850.000 homens da Alemanha via-se diante de uma força francesa de 708.000 e britânica de 250.000. Cada lado poderia colocar entre dois e três milhões de homens sob mobilização total. Em teoria, a Alemanha, com uma população acima de 80 milhões, deveria ser capaz de manter um equilíbrio numérico. Mas, na realidade, as exigências da produção interna esperava-se fossem mais sérias na Alemanha que na França ou Grã-Bretanha. Uma tentativa de cálculo pôs o total do potencial humano alemão em três e meio milhões contra cinco milhões da Grã-Bretanha e França. E no caso dessas reservas, a ausência de um treinamento militar geral na Alemanha depois de 1919, conquanto modificada pela existência de organizações semimilitares, parecia afetar a qualidade dos seus recrutas, comparadas com os da França. Outro defeito atribuído à Alemanha era o pequeno número de oficiais competentes nos postos de responsabilidade, de capitão a coronel. O Estado-Maior alemão pode ter retido todo o seu antigo brilho, mas os oficiais superiores pareciam constituir um ponto decididamente fraco na sua máquina militar.
Onde a Alemanha tinha a maior preponderância era no ar. Embora, faltassem estatísticas precisas, tinha ela provavelmente 10.000 a 12.000 aviões, dos quais talvez 6.000 eram de primeira linha. A força combinada anglo-francesa era certamente menor que esta, talvez de uns 20%. Essa inferioridade quantitativa, entretanto, pode, em certos pontos, ter sido modificada pela superioridade qualitativa. Havia motivos para crer-se que os aviões britânicos eram mais bem construídos e que os velozes caças alemães careciam de flexibilidade de manobras alcançada por seus rivais britânicos. E aqui novamente a rápida expansão da Alemanha envolveu um problema de pilotos treinados e, particularmente, de comandantes de esquadrilha. Sob esse aspecto, e no tocante ao seu pessoal, a força aérea britânica era provavelmente, para o seu tamanho, a mais poderosa da Europa.
No ar, as perdas e deterioração combinadas, calculava-se, deveriam atingir em tempo de guerra 90% mensais. Em capacidade de substituição, como efetivo inicial, a Alemanha partiu com vantagem, vantagem que se esperava fosse temporária, apenas. Contra a sua produção de 1.000 a 1.200 por mês havia a produção britânica de 700 a 800 e francesa de possivelmente 200 aparelhos. Em perto de um ano, cálculos aceitáveis punham a produção aliada apenas ligeiramente atrás da alemã, estimada em 1.500 aparelhos por mês, e creditou-lhes cerca de 8.400 aparelhos contra possíveis 9.300 da Alemanha. Além disso, a Grã-Bretanha estava desenvolvendo no Canadá uma indústria aeronáutica e campos de treino para pilotos cuja contribuição seria certamente de primeira importância. Mesmo os cálculos mais moderados acreditavam que qualquer resto de superioridade alemã dificilmente perduraria até depois da primavera.
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